A representação feminina na arte e cultura ao longo dos anos vem quebrando paradigmas e ocupando espaços antes dominados, prioritariamente, por homens. Para elas, que mantêm seus trabalhos elevando diversas vozes femininas, encabeçar e desenvolver projetos para incentivar outras meninas é uma forma de fazê-las protagonistas de suas histórias, donas de suas narrativas, desejos e vontades.
Ao longo dos anos, em sua gestão, o governador Gladson Camelí tem viabilizado projetos, ações e medidas que impulsionam o setor cultural, incentivando a participação de mais mulheres no segmento.
Somente no ano passado, a Fundação de Cultura Elias Mansour (FEM) conseguiu viabilizar R$ 41 milhões para o estado por meio das leis de incentivo Aldir Blanc (LAB) e Paulo Gustavo (LPG), além do Fundo Estadual de Cultura, impulsionando atividades culturais em todos os municípios.
“Temos garantido em todos os editais um recurso específico para as mulheres. Nós tivemos a Lei Paulo Gustavo, que trouxe para o estado do Acre R$ 22 milhões e, nos editais específicos que nós lançamos para os povos indígenas, 50% dos recursos são garantidos para as mulheres indígenas. Isso é um respeito principalmente às nossas mulheres indígenas”, explica Minoru Kinpara, presidente da FEM.
Os editais, segundo Kinpara, já tentam corrigir uma disparidade social que é preciso combater constantemente, reconhecendo os diferentes talentos que o estado possui e criando um ambiente de oportunidade igualitário.
“Os projetos, os editais que são lançados, já preveem um bônus para aqueles trabalhos produzidos por mulheres e isso ajuda a gente a corrigir uma diferença, que está ligada a muitas questões sociais”, avalia.
Kelen Mendes é produtora cultural, cantora, compositora e comunicadora e tem, por meio dos recursos voltados para a cultura, fortalecido outras mulheres criando um verdadeiro, parafraseando um de seus projetos, cordão de Iaras.
São mulheres que dividem sua arte e se fortalecem entre si, tornando-se referência e uma ponte para o intercâmbio cultural entre outros estados. Ela, inclusive, realizou o 1º Festival Norteadas, quando entrevistou e apresentou uma Mostra reunindo dez mulheres compositoras da Região Norte.
“Tenho meu show que se chama Ancestralidade, onde tenho ampliado totalmente a presença de mulheres na equipe do show. Antes eu tinha uma banda formada só por homens, hoje ainda toco com a mesma banda, porém tenho uma figurinista, uma assessora de mídia, duas mulheres cantando junto, duas mulheres convidadas para participação especial, entre elas uma mulher trans. Então, eu ampliei totalmente a presença das mulheres na equipe”, destaca.
Ela reconhece que o trabalho de outras mulheres no passado foi fundamental para que hoje ela ocupasse esse lugar, abrindo espaço também para que outras artistas pudessem caminhar juntas.
Inclusive, ela cita Nazaré Pereira, cantora, compositora, atriz e dançarina, com muitos álbuns e canções para contar poeticamente sua história. Natural de Xapuri, no Acre, tendo se mudado para Belém aos sete anos de idade, ela se consagrou na França. Inclusive, foi a única cantora brasileira a receber, pelo conjunto da obra, o prêmio Louis Ganne, da França. Inspirada por ela, Kelen também está lançando livro com todas as suas composições.
“Fortalecer a voz feminina foi algo que me estimulou muito a ser compositora e estar com outras compositoras só fortalece, porque nós nos fortalecemos umas às outras. Fortalece a nossa voz, a nossa visão de mundo, que é o que a gente põe para fora quando a gente canta as nossas músicas”, avalia.
Para ela, essa ocupação feminina de seus espaços é um processo que está sendo acompanhado pouco a pouco: “Nós compomos, gravamos, elaboramos os nossos projetos, pensamos nos nossos shows. Hoje você pode sentar para assistir um show todo de uma compositora, e as leis de incentivo e o poder público são totalmente fundamentais”.
Uma das idealizadoras da Central de Slam Acre, Natielly Castro, conhecida como Nati de Poesia, é campeã nacional do Slam Singulares de 2023, mesmo ano em que a jovem Cristina Santos, conhecida como “Medusa AK”, venceu o Campeonato Nacional de Poesia Falada Slam das Minas BR.
Duas mulheres acreanas que levaram o nome do estado e elevaram a arte entre diversos concorrentes de todo o país.
“O Slam das Minas é um projeto que, desde 2018, existe realmente para trazer a presença das mulheres neste cenário, da poesia marginal do Acre, e fortalecer a literatura de modo geral, principalmente essa literatura que fala das margens da sociedade. É um projeto que não envolve somente mulheres, mas também a comunidade LGBTQIAPN+, que está inserida como participante. É feito por mulheres, para mulheres e para a comunidade LGBTQIAPN+. Ele é um campeonato de poesia falada, mas que também agrega outras atividades. Então, temos apresentações de dança, música, performances e, no modo geral, apresentações culturais”, explica Nati.
A ideia, segundo ela, é ser um espaço de livre expressão, principalmente de regiões periféricas, e torna-se seguro para que mulheres possam falar e serem ouvidas.
“Essas conquistas são importantes porque trouxeram também essa visibilidade nacional para a poesia marginal do Acre e fizeram com que outras meninas pudessem se ver nesse espaço de protagonismo, de potência periférica da palavra, e de alguma maneira nos fizeram galgar alguns outros caminhos”, pontua.
Nati define sua escrita como a expressão da realidade em que vive como mulher negra e seu corpo na sociedade.
“Falam de questões de identidade, de sexualidade. Falam muito de identidade amazônica, como esse legado ancestral que a gente tem. E a minha poesia fala também sobre as minhas vivências pessoais, como diz Conceição Evaristo, as minhas escrevivências, as minhas escritas vividas, o dia a dia, o cotidiano, os atravessamentos pessoais e coletivos que a gente passa. Minha poesia fala sobre isso. É uma poesia marginal”, explica.
Ao avaliar os recursos voltados para que esses artistas cresçam, ela reforça que as leis, projetos voltados para fomentar a arte, são formas de dar voz a quem tem muito o que falar e quer ser ouvido:
“Quaisquer maneiras de incentivo à cultura são muito bem-vindas, principalmente para a cultura hip-hop, porque é uma comunidade que tem uma dificuldade de acesso às informações, por ter sido colocada à margem da sociedade. Então, os editais da FEM, do governo federal e até mesmo de empresas privadas são importantes para que a gente consiga financiar a nossa arte, consiga fazer as coisas com qualidade e, cada vez mais, se veja como um artista trabalhador e um trabalhador artista”.
Com sua arte sendo fomentada, ela acredita que inspira outras mulheres e, além disso, muda realidades. Em fevereiro, por exemplo, com o apoio da FEM, a Central de Slam Acre promoveu a 12ª edição do projeto “Poesia que Escurece”, iniciativa que já formou mais de mil alunos no estado .
“A maneira que encontrei de fazer essas mulheres se sentirem potencializadas é colocá-las em espaço de protagonismo, para entenderem que tudo o que fazem é arte”, completa.
O grupo Moças do Samba, desde 2013, alia música e artes cênicas ao protagonismo feminino e às causas afro. Formado por Carol Di Deus, Narjara Saab e Sandra Buh, o trio já gravou um EP intitulado “Feminina Voz do Samba”. E elas vêm, ao longo dos anos, levando também para o palco as vozes de tantas outras mulheres.
Para Narjara, mais do que música, o grupo pode ser considerado sinônimo de resistência:
“A nossa existência em si é muito importante, porque marca essa resistência da mulher em um cenário que é dominado pelos homens e que resiste desde 2013. Muitas pessoas viram as costas para nós, acham que somos aventureiras por cantarmos samba, não nos veem como um grupo legítimo. Então, a gente existir e resistir é importantíssimo para que outras mulheres entendam que esse espaço também é nosso”.
Com um repertório que consideram não comercial, Narjara destaca que somente com leis de incentivo o trabalho pode ter continuidade, incentivando também outras mulheres a expressarem sua arte.
“Os editais de cultura são responsáveis por nossa resistência e pela permanência e constância do nosso trabalho, que é extremamente importante para a nossa sociedade. Não me sinto uma referência, mas sabemos que sempre que uma de nós chega em algum lugar acaba inspirando outras. Então, me sinto orgulhosa e cumprindo o meu papel como mulher”, pontua.
Para Carol Di Deus os sonhos ainda são muitos, mas as conquistas até aqui são celebradas. Mais do que música, ela acredita que o grupo tem o papel de mostrar as diversas histórias femininas, em suas diferentes trajetórias, e essa representatividade leva ao público a sensação de pertencimento.
“A gente tem um trabalho de trazer a histórias dessas mulheres em um meio que é masculino, mas há mulheres importantíssimas e incríveis, que têm suas trajetórias, que são mães, têm uma rotina e podem fazer cultura. Então, mostrar isso é engrandecedor. E, nesse universo, nós temos muitos sonhos, que é ver nossa cultura, não só do grupo, mas do nosso estado, difundida e valorizada aqui e lá fora”, planeja.
“Ainda estamos aqui, ainda assim
Com o s cortes no peito,
Os cortes do açoite,
Os cortes feitos pelas mãos de homens que se fizeram violência
Tatuamos na pele três números 1 8 0
Da rua da minha favela já saiu muito mais revolução do que os livros escritos pelos caras pálidas!
Tenho milhares de Marias em minha companhia, ancestrais curandeiras! Pretas, de norte de cima abaixo do corpo!
Revolução pra mim é pouco,
Quero cerveja,
Tocar meu corpo,
E ser cada dia mais mulher da minha vida.
Hoje corto o cordão umbilical que me liga a esse mundo machista e sexista, e saio pra fazer festa dentro da minha liberdade de mulher!”
Nati de Poesia
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